Na Amazônia, um cemitério de homens e de máquinas que desafia o tempo, o abandono e os saqueadores
No histórico Cemitério da Candelária estão sepultados milhares de trabalhadores que perderam a vida construindo a lendária Ferrovia do Diabo.
Locomotiva abandonada em frente ao Cemitério da Candelária. Créditos: Rubens Coutinho
Por Rubens Coutinho
Na região central de Porto Velho, capital de Rondônia, existe um local onde está preservada, mesmo que precariamente, a história de uma epopeia no meio da outrora exuberante selva amazônica.
Trata-se de uma parte do patrimônio histórico da “Estrada de Ferro Madeira-Mamoré” (EFMM), concluída em 1912. No local, também está preservada a memória dos milhares de trabalhadores que perderam a vida na obra que é considerada pelos historiadores como um dos maiores desafios da engenharia ferroviária no Brasil.
Frente a frente, coexistem dois cemitérios: um de homens, outro de máquinas. A separá-los, uma pequena estradinha de terra, cercada de mata nativa, quase margeando o rio Madeira, um dos afluentes do Amazonas.
No Cemitério da Candelária, descansam trabalhadores recrutados no mundo todo. A maioria morreu de doenças endêmicas da região. E no Cemitério das Locomotivas, estão as máquinas e equipamentos que ficaram pelo caminho quando, em 1972, a administração militar da Madeira-Mamoré fez uma cerimônia de adeus no pátio da ferrovia. Todas as locomotivas que ainda podiam rodar foram reunidas no centro de Porto Velho e soaram o seu último apito.
A professora de História, Rita Clara Vieira da Silva, formada pela Universidade Federal de Rondônia, faz parte de um grupo de historiadores que defende a preservação dos dois cemitérios e comenta sobre o fim da ferrovia. “A desativação das estradas de ferro no Brasil deu seus primeiros passos durante o Governo de Juscelino Kubitschek, que começou a construir as grandes rodovias. Décadas depois, nosso papel é de preservação da nossa ferrovia, ou do que restou dela”, diz a historiadora.
Ainda, segundo a historiadora, quem desativou a Madeira-Mamoré foi o governo da ditadura militar. “Na medida em que os militares iam asfaltando as rodovias, acharam desnecessário manter a EFMM. Alegaram que era caro mantê-la”. Atualmente, apesar dos esforços de pessoas como Silva, os dois patrimônios sofrem dilapidação. Trilhos, dormentes, partes dos equipamentos e até as sepulturas dos trabalhadores sofrem constantes saques.
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