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“A pintura é uma forma de manifestar o que não consigo dizer em palavras”

Por meio da pintura, o artista plástico e fotógrafo de Navegantes (SC), se expressa e manifesta o que sente em suas obras.


Por Keny Henrique Mariguele


Foi ainda na infância que o catarinense, Mario Lucas Konze, de 29 anos, começou a se interessar e a se expressar por meio dos desenhos. Aquilo que seria apenas uma coisa de criança, veio a se tornar um trabalho quando ele completou 20 anos. A Revista F entrevistou o artista plástico em seu ateliê, um espaço composto por muitos livros e telas pintadas por ele. O artista nomeia o ateliê como “caverna”, onde se isola e produz suas obras em uma espécie de palco (uma parte mais elevada do espaço). Konze conta como foi o processo de se encontrar com a arte e o que ela representa em sua vida. Ainda, o artista plástico comenta sobre como a pandemia afetou seu processo criativo, o processo de criação de suas obras e, por fim, suas inspirações e referências.


Revista F: Quando começou a desenhar e pintar?

Mario Konze: Comecei na infância. Como ficava muito tempo de castigo, a única coisa que podia fazer era desenhar e, eu me expressava através dessa arte. Depois, parei de desenhar e, por volta dos meus 20 anos, por acaso, voltei a fazer desenhos. Vi uma amiga com uma camiseta que gostei muito e perguntei onde ela havia comprado aquela peça. Ela respondeu: “eu quem desenhei”. Fiquei impressionado e curioso ao saber sobre as canetas que ela havia usado para fazer aquilo. Então, ela me deu uma caneta e eu fiz a primeira pintura numa camiseta branca. Depois, fiz outras pinturas e as pessoas começaram a se interessar. Assim, surgiram as primeiras encomendas, depois abri uma empresa que passou a ser minha principal fonte de renda.

Revista F: E como surgiu o interesse em pintar em telas?

Mario Konze: Com a pintura das camisetas percebi que queria ampliar minha experiência com a arte. Um dia, comprei uma tela de 80x120 cm e comecei a primeira pintura. Foi uma experiência intensa e gostosa, pois, a cada pincelada, eu me arrepiava. Senti um prazer muito grande em construir camadas e disse para mim mesmo: “É isso!”. Tive a certeza que precisava fazer aquilo, mas sabia que precisava estudar e me aperfeiçoar. Na pintura, o tamanho da tela importa. Pois, uma tela grande, em branco, me intimida. É uma janela grande que, sem conseguir explicar, precisa ser preenchida.


Revista F: Em 2021, na sua exposição, às telas apresentavam cenários diferentes. Porém, seguiam um padrão como, por exemplo, sendo imagens femininas, com espelhos ou janelas mostrando cenários opostos. Você costuma pensar em série para produzir o seu trabalho?

Mario Konze: No início, comecei a fazer alguns retratos para tentar estabelecer uma técnica. Pois, como nunca aprendi a pintar, sempre fui fazendo com base na minha intuição. Até que, em um dia de tédio, pensei: “vou pintar o que vier na minha cabeça”. O padrão existente na exposição de 2021, foi ao acaso. Representa a minha expressão do momento em que foi produzida. No entanto, atualmente estou desenvolvendo um trabalho em série. Ele se chama “Carnes do Pensamento'', no qual será composto por 18 partes do corpo.


Revista F: A pandemia do Covid-19 influenciou na sua manifestação artística? Como?

Mario Konze: Bastante, pois também me senti ansioso e me perguntando: “o que está acontecendo?”. Meu pai chegou a ficar internado em estado grave e, eu só conseguia me expressar por meio da pintura. Foi um período de reclusão e de intensa expressão. A pintura é uma forma de manifestar o que não consigo dizer em palavras. Preciso pintar, não sei explicar. Parece clichê, mas é como se o real não me bastasse. Preciso estar sempre fantasiando as coisas porque, para mim, o imaginário é sempre muito mais confortável. Então, pintei a “Pandenica”, que é inspirado na obra “Guernica” de Pablo Picasso, no qual é retratado o desespero do povo com a Guerra Civil Espanhola e, na “Pandenica”, existe referência ao hospital, ao sofrimento das pessoas e ao governo.


Revista F: Como você lida com as interpretações do público acerca das suas obras?

Mario Konze: É bem interessante isso. Porque no início, o foco nunca foi pintar para alguém. Era apenas a minha forma de se expressar. Por isso, nunca criei uma expectativa sobre como iriam entender o que tinha sido feito. Após a fase da pintura das camisetas, retornei a um trabalho na área de logística e pensei: “Bom, esse será o meu trabalho. Vou ficar aqui, quieto, pintando para satisfação pessoa. Só depois de um tempo passei a dizer às pessoas que também era um pintor". Mas atualmente, gosto de ouvir o que as pessoas acham do meu trabalho, seja positivo ou negativo. Até porque, muitas vezes, nem eu sei interpretar o que está sendo representado. Por exemplo, meu amigo está escrevendo um livro no qual cita um dos meus quadros. Ele escreveu várias páginas falando sobre essa obra e eu não conseguiria escrever nem um parágrafo sobre aquele quadro, em específico. Acho isso muito interessante e comecei a gostar disso. De alguma forma, posso incomodar e estimular as pessoas a refletirem sobre algo que também me incomoda. Eu pinto para mim, porque me incomoda. Essa exposição é interessante porque fala sobre mim, de alguma forma. É como se eu estivesse pelado e para isso, é preciso ter coragem. Existem questões políticas ali que, às vezes, estão ocultas ou representadas de forma simbólica, por exemplo. O importante é ser honesto com o que estou sentindo.

Revista F: Qual foi a primeira pessoa a ver um dos seus quadros e a te incentivar a mostrar o seu trabalho?

Mario Konze: Meu pai, ele chorou quando viu. Minha mãe, irmã e tias choraram, também, quando viram. E à medida que mostrava para outras pessoas da família, elas também se emocionavam. Eles conheceram meu trabalho ainda na época das camisetas, mas eram contra. Quando comecei a desenhar, eles perguntavam: “você vai viver de arte? Você acha que isso vai dar certo?”. Por isso, quando comecei a pintar nas telas, não contei para eles. Quando mostrei o primeiro quadro, o qual tenho muito orgulho dessa obra, porque embora não tenha uma estética bela, foi uma construção bonita para quem não sabia pintar - gostei da harmonização que consegui com as cores -, meu pai disse: “você é um artista!”. Embora não me importe com o termo artista, indico essa categoria nas redes sociais para cumprir um contrato social, mas não luto pelo artista. Eu luto pela linguagem. Luto por dizer as coisas de uma forma que não consigo falar. Hoje, tenho o apoio da minha família. Essa aceitação foi um processo muito bonito.


Revista F: Você acredita que o seu trabalho é um dom?

Mario Konze: Não acho que seja um dom, mas acredito que tenho muita sensibilidade para a imagem e para a estética. Isso foi desenvolvido desde a infância, pelo meu interesse em representar o imaginário. A literatura, por exemplo, ajuda demais no meu trabalho. Pode parecer estranho pensar que eu treino a pintura a partir da literatura, mas para mim, o que importa é aplicar o conceito. Eu gosto muito da parte abstrata. Por isso, me inspiro no Kandinsky. Ele tem um conceito - que acho muito lindo -, de que a arte é como uma religião. Apesar disso, não considero o meu trabalho como um dom.


Revista F: Além do artista Wassily Kandinsky, quais são suas outras referências?

Mario Konze: Gosto muito do gaúcho Iberê Camargo, que trabalhou com associação livre da vida dele. Também do paulista Mário Gruber, que pintou uns palhaços em um cenário bem escuro. Gosto muito da ideia dele. Todos eles me ajudam muito.


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